A Hanseníase é uma doença crônica, transmissível, tem preferência pela pele e nervos periféricos, podendo cursar com surtos reacionais intercorrentes, o que lhe confere alto poder de causar incapacidades e deformidades físicas, principais responsáveis pelo estigma e discriminação às pessoas. A transmissão se dá de uma pessoa doente sem tratamento, para outra, após um contato próximo e prolongado. A doença tem cura e o tratamento é gratuito e ofertado pelo SUS em unidade de saúde do país.

O Ministério da Saúde (MS) promove em parceria aos estados e municípios, ações de vigilância e educação em saúde, com o objetivo de alertar a população sobre os sinais e sintomas da doença e incentivar a procura pelos serviços de saúde, além de mobilizar os profissionais de saúde à busca ativa de casos e investigação dos contatos, especialmente os de convivência domiciliar

(grupo com maior risco de adoecimento). As ações de busca ativa têm como foco o diagnóstico precoce da doença, o tratamento oportuno e a prevenção das incapacidades físicas. 

O MS recomenda que as pessoas procurem o serviço de saúde ao aparecimento de manchas em qualquer parte do corpo, principalmente, se essa mancha apresentar alteração de sensibilidade, o que configura um dos sinais sugestivos da doença.

Em dez anos, o Brasil apresentou uma redução de 37,1 % no número de casos novos, passando de 40,1 mil diagnosticados no ano de 2007, para 25,2 mil em 2016. De forma semelhante, observa-se também a queda de 42,3% da taxa de detecção geral do país (de 21,19/100 mil hab. em 2007 para 12,23/100 mil hab. em 2016). Do total de casos novos registrados, 1,6 mil (6,72%) foram diagnosticados em menores de 15 anos, sinalizando focos de infecção ativos e transmissão recente, e 7,2 mil iniciaram tratamento com alguma incapacidade.

No mês em que é celebrado o Dia Mundial de Luta Contra à Hanseníase (janeiro roxo) – cor definida em 2015 para simbolização do enfrentamento à doença no país -, no intuito de alertar a população a respeito da doença, o Blog da Saúde entrevistou a Coordenadora Geral de Hanseníase e Doenças em Eliminação do Ministério da Saúde, Carmelita Ribeiro Filha. Confira a entrevista:

 

Blog da Saúde: O que é a Hanseníase?

Carmelita Filha: É uma doença dermatoneurológica, que tem manifestação na pele, como a presença de manchas com alteração de sensibilidade. A parte neurológica vem do comprometimento dos nervos periféricos, responsáveis pela sensibilidade e motricidade. Por isso, a hanseníase é a única doença dermatológica que tem alteração de sensibilidade na pele.

Blog da Saúde: E quais são os principais sinais e sintomas?

Carmelita Filha: Os principais sinais e sintomas são: manchas na pele com alteração da sensibilidade térmica e/ou dolorosa e/ou tátil; comprometimento neural periférico em mãos e/ou pés e/ou face. Outros sinais e sintomas são: dor e sensação de choque, fisgadas e agulhadas ao longo dos nervos dos braços, mãos, pernas e pés; Caroços e inchaços no corpo, em alguns casos avermelhados e doloridos; diminuição da sensibilidade e/ou da força muscular de olhos, mãos e pés; áreas com diminuição dos pelos e do suor.

É comum as pessoas falarem que estão com uma mancha dormente no corpo. Mas é importante ressaltar que nem sempre a mancha relacionada à hanseníase vai estar totalmente dormente, depende do tempo em que esta pessoa se encontra doente. As manchas podem ser esbranquiçadas, avermelhados ou amarronzadas, que não doem, não coçam e aparecem geralmente em lugares como as costas, braços, perna e rosto, mas isso não elimina outras áreas do corpo. É uma mancha que aparece no corpo e que muitas vezes as pessoas não se sentem incomodadas, por isso a importância estarem atentas para os sinais e sintomas da doença. Ressalta-se que também que há pessoas que podem estar doentes e apresentarem alteração neural, sem a presença de manchas.

Blog da Saúde: E quais são as causas? É uma doença transmissível?

Carmelita Filha: A hanseníase é uma doença milenar, possui um período de incubação longo e é transmissível. Então uma pessoa que possui Hanseníase do tipo multibacilar que não esteja em tratamento transmite a doença, geralmente para quem está mais próximo. São as pessoas que moram com o doente sem tratamento ou que convivem por um período prolongado e continuo que tem maior chance de adoecer. O agente etiológico que causa a doença é o Mycobacterium leprae. A doença é transmitida por meio das vias aéreas superiores (ex: tosse e espirro). As pessoas ficam muito receosas em estar perto de quem tem a doença, mas falta conhecimento de que não é em um contato rápido que haverá transmissão. Envolve uma rotina diária de contato. E ainda assim, para que a pessoa que recebeu a carga bacilar adoeça, envolve também outras questões como a resistência imunológica de cada indivíduo.

Blog da Saúde: Quais são os tipos de hanseníase? Todos eles são transmissíveis?

Carmelita Filha: A hanseníase possui duas classificações operacionais: paucibacilar e multibacilar. A forma paucibacilar, é a inicial da doença e o tratamento é realizado com seis doses de Poliquimioterapia (PQT). Na forma multibacilar, o tratamento é realizado com doze doses de PQT. Quem faz diagnóstico é o médico da equipe de Estratégia de Saúde da Família/ESF, da Unidade de Saúde mais próxima à residência. O diagnóstico da doença é essencialmente clínico. Contudo, em algumas situações mais complexas se faz necessário a realização de exames complementares.

Blog da Saúde: E como as pessoas podem evitar a contaminação? Quais os cuidados?

Carmelita Filha: A forma de prevenção é diagnosticar os casos precocemente. Não é uma doença que tem vacina para evitar. A prevenção consiste no diagnóstico de todas as pessoas o mais rápido possível, e tratar para que as pessoas evitem a transmissão. A transmissão da doença deixa de ocorrer no início do tratamento. Outra questão é que é muito difícil saber de quem pegou a doença, por que tem um período de incubação longo, e pode ficar em média cinco anos sem apresentar sinais e sintomas característicos, de forma que a pessoa não saiba que é portadora da doença. Por isso a importância de examinar todos os contatos, que convivem ou conviveram de forma domiciliar ou social com o doente antes do tratamento. A investigação dos contatos é a principal forma de interromper a cadeia da transmissão, na medida que se elimina as fontes de infecção. Assim, mobilizamos os profissionais de saúde para que fiquem atentos aos sinais e sintomas da hanseníase, pois somos o segundo país com maior número de casos da doença no mundo. Por isso, alertamos para o diagnóstico não só do paciente, mas também para a importância de que toda a família e os contatos próximos também sejam examinados e diagnosticados o quanto antes.

Blog da Saúde: E como as pessoas podem procurar um serviço de saúde para fazer o diagnóstico?

Carmelita Filha: A hanseníase é uma doença que está na Atenção Básica, então orientamos que em caso de suspeita, a pessoa deve procurar uma Unidade de Saúde do seu município mais próxima de sua residência. Ali a equipe pode examinar, dar o diagnóstico, e logo iniciar o tratamento. O tratamento da doença é gratuito e está disponível em unidades de saúde.

Blog da Saúde: Mesmo sem sintomas, eu posso procurar a Atenção Básica?

Carmelita Filha: Se algum amigo ou parente da família teve a doença, é ideal que todos procurem, mesmo que não tenha nenhum sinal ou sintoma.

Blog da Saúde: E como funciona o tratamento?

Carmelita Filha: Quando o paciente tem o diagnóstico de hanseníase, ele recebe todas as informações e inicia o tratamento imediatamente. O período regular do tratamento dura um ano para os casos de hanseníase multibacilares, e seis meses para os casos paucibacilares. A primeira dose é dada diretamente na unidade de saúde. Funciona assim: todo mês o paciente tem que ir à Unidade para tomar uma dose supervisionada do remédio, ou seja, na frente do profissional de saúde, e pegar o resto da medicação para ser tomada durante 28 dias, todos os dias. Em caso de paucibacilar, um comprimido por dia, no caso de multibacilar, dois comprimidos. Concluindo o uso da cartela que possui em casa, o paciente volta à Unidade, toma a medicação supervisionada, e leva nova cartela da medicação, até o fim do tratamento quando ela está curada. Caso apesente algum problema com o uso da medicação, é na Unidade que ele deve pedir orientação.

Blog da Saúde: Hanseníase mata?

Carmelita Filha: Não mata, mas traz deformidades físicas se não for tratada de forma adequada e precocemente.

Blog da Saúde: Por que as pessoas que possuem a doença são estigmatizadas?

Carmelita Filha: O principal fator são as sequelas, pois a hanseníase poderá causar deformidade física. A pessoa que tem o tipo multibacilar, que é o tipo que transmite, quando tem o diagnóstico tardio, tem mais chance de ter uma incapacidade física. A micobactéria pode acometer os nervos periféricos dos olhos, mãos e pés. As pessoas que estão curadas, não transmitem mais, mas são estigmatizadas pela aparência, e a gente não deve discriminar o próximo pelo que está vendo. É uma pessoa como qualquer outra, apesar de alguns casos apresentarem algum tipo de sequela decorrente da doença. Assim, devemos evitar o preconceito, com qualquer pessoa que tenha qualquer tipo de deficiência física. (Material produzido por Aline Czezacki, para o Blog Saúde, do Ministério da Saúde, onde foi publicado na seção Promoção da Saúde, no dia 31/01/2018, com atualização no dia 01/02/2018, às 15h20).