Conversamos com o ex presidente da Sociedade brasileira de Hansenologia e Professor Associado de Dermatologia do departamento de clínica Médica da Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto (USP), o Dr. Marco Andrey Cipriani Frade, que falou à Folha de São Paulo sobre esse aumento no número dos casos de hanseníase nos últimos dois anos.
Ele explicou que diferente do que o governo e gestores políticos pensam, esse aumento nos casos não é um número necessariamente desagradável, ou que indique fragilidade do sistema de saúde. Na verdade, esse aumento pode ser interpretado positivamente, como aumento nos esforços e do controle da doença no país. “É resultado de programas pontuais de busca ativas, do Ministério da saúde e também da busca por qualificar profissionais da saúde para identificar melhor a doença nas cidades de maior endemia da hanseníase.”
A falta de informação é um grande problema que dificulta avanços no tratamento da hanseníase, em outras palavras, poucos médicos se sentem confiantes para dar o diagnóstico graças a alta complexidade de analisar os sintomas. Dr. Marco Andrey relata que cerca de 50% dos exames podem indicar negativo para doença, mesmo que o paciente tenha o bacilo e isso faz com que um outro exame complementar deva ser feito para obter-se uma resposta definitiva que indique a alteração neurológica do paciente.
“Nossos profissionais de saúde e a academia passaram a acreditar que a hanseníase é um problema de saúde controlado no Brasil, diminuindo a importância [de informar] da doença na formação dos nossos profissionais de saúde e isso é um motivo de porque os nossos médicos estão saindo da faculdade despreparados para cuidar da hanseníase.”
Outro fator que aumenta dificuldade é que os sinais de sintomas mais avançados da doença são subjugados como sinais normais de envelhecimento, como dormências, formigamento e dores neurais. “A classificação que existe na Organização Mundial da Saúde restringia os sinais da doença a apenas as manchas, mas sabemos que a doença se manifesta, primariamente de forma neural e o sinal dermatológico normalmente chega depois.”
Fatores impeditivos
São esses os que dificultam a busca pelo controle da doença, um exemplo é o cenário político-administrativo de constante instabilidade e transição que o Brasil passou, associados a mudança de prefeituras. “Muitas vezes há uma mudança de toda a estrutura dos municípios e isso também reflete na mudança dos profissionais de atenção básica, então às vezes os profissionais que foram treinados em uma cidade, tiveram de mudar pra outra cidade, interrompendo o trabalho feito naquela região […] O que pode explicar a queda nos diagnósticos de 2015 e 2016.”
O especialista diz que a mídia e o governo falam de eliminação da hanseníase no Brasil, mas ainda temos um extenso percurso para conter a doença. “Vimos na mídia e no governo, falas como eliminação da hanseníase e até erradicação da hanseníase, isso é uma desinformação, pois não temos vacina para essa doença, que é uma doença crônica, então, podemos ter o controle, mas ainda é muito difícil falarmos de erradicação, é uma realidade distante da nossa.”