Participante do projeto “Hanseníase em redes de interfaces: saúde educação e sociedade” na região do semi-árido do Brasil conta sua experiência vencendo o estigma

“Olha, não tenho nada de ruim para falar do curso” declarou Taiza Oliveira de 32 anos, participante do ciclo formativo do projeto Hanseníase em Rede de Interfaces que aconteceu em Mossoró, uma das cidades mais endêmicas da doença no estado do Rio Grande do Norte. Convidada a fazer uma avaliação crítica do curso, ela compartilhou que nunca imaginaria a que sairia do curso com um tão olhar diferente para uma doença.

A hanseníase entrou na vida de Taiza com diagnóstico do seu marido depois de um longo caminho de problemas de saúde. Em 2016, viu seu companheiro adoecer em um surto de chikungunya na zona rural de Mossoró, onde vive há 30 anos. Após um tratamento de duas semanas, os sintomas continuavam: Fortes dores no corpo, articulações e febre alta. Foram 10 meses tratando de outras doenças como Lúpus, para chegar ao diagnóstico certo, tinha uma doença rara: doença de Still.

Ela conta que alguns anos depois, ele voltou a sentir fortes dores novamente, dessa vez era nos cotovelos e irradiava para as mãos, com dormência e perda parcial da força, febre. Então, mais uma vez foram às pressas de médico em médico, até descobrir o que ele tinha. Depois de muitos exames o médico chegou ao diagnóstico de hanseníase, indicou o tratamento de 12 meses. Hoje ele está bem, curado. Trabalhando, apesar de algumas sequelas.

Mais sobre o Projeto Hanseníase em Redes

Taiza é natural da cidade de Assu, também no Rio Grande do Norte e foi convidada para participar do curso por uma das facilitadoras do projeto que trabalha na Unidade Básica de Saúde (UBS), onde seu marido teve o diagnóstico da hanseníase. “Sou de família pobre. Tenho apenas um irmão, sou filha de Antônio e Levi que são aposentados. Eu sou aquela pessoa da família que resolve tudo para todo mundo rsrs.

Tenho um companheiro e dois filhos.” conta orgulhosa da sua trajetória até o momento da entrevista.

Passou por dificuldades para estudar, iniciou o ensino fundamental em armazéns, o que diz ser comum na comunidade onde mora. Mas para concluir o ensino médio, tinha que ir a Mossoró diariamente: “Sempre estudei em escola pública, conclui o ensino médio com muita dificuldade, pois tinha que ir pra Mossoró, e o ônibus vivia quebrando”.

Quando questionada sobre o que conhecia sobre a AIFO, ela constrangida confidenciou que não sabia muito. “Eu nunca tinha ouvido falar na Brasa(AIFO), soube da existência depois que entrei no projeto Hanseníase em Rede. Só sei que é como se fosse um grupo de pessoas que se uniram para trabalhar na divulgação de doenças negligenciadas. Com intuito de melhorar a qualidade de vida das pessoas que vivem com essas doenças” e complementa, “Fiquei muito feliz em poder conhecer a AIFO, por saber que existem pessoas que se preocupam com esses pacientes que são tão esquecidos, e muitas vezes até escondidos, nasceu para dar voz a essas pessoas.”

Foi no prédio de enfermagem da Universidade Estadual do Rio Grande do Norte em que os encontros presenciais do projeto ocorreram para dar finalização a cada módulo do curso. Essa formação tem o propósito de unir em rede, os atores capazes de melhorar, de forma duradoura, o quadro da hanseníase: a sociedade, a saúde e a educação. Unindo as pessoas participantes desses três campos, usuários, profissionais da saúde e da educação popular. De forma que dialoguem sobre os problemas sociais da doença e com isso, fazer com que a comunidade esteja mais próxima do serviço de saúde.

Taiza durante um dos encontros presenciais do curso, está sentada de pernas cruzadas com a bolsa do projeto pendurada na cadeira, ela olha pra baixo enquanto escreve

“Participar do projeto me ajudou a conhecer um pouco mais sobre a doença, sobre os sintomas e até sobre o tratamento. Agora se me deparar com alguém que esteja com algum sintoma ou mancha que possa ser hanseníase, já sei para onde encaminhar, o lugar pra pessoa poder ir se cuidar e além disso, tenho minha experiência pessoal para contar.”

Taiza quer continuar a estudar, pretende entrar em uma universidade pela prova de Exame Nacional do Ensino médio (ENEM) para cursar fisioterapia ou serviço social. Pois vê nessas carreiras, a oportunidade de ajudar as pessoas, especialmente na área da saúde, onde tem mais interesse. “Sei o quanto é difícil ficar doente, o quanto é difícil conviver com pessoas doentes. E por ter passado por todas essas experiências que quero ajudar a cuidar da dor do outro.”